Marcelo Berti

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O Vinho como Benção Divina

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A procedência divina do vinho no Antigo Testamento

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fev 03, 2025
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O Vinho como Benção Divina
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Diferente de muitas pessoas vocacionadas, decidi ir muito cedo para o Seminário. Por causa disso, iniciei meus estudos teológicos ainda bastante imaturo. Tinha muitas perguntas que ansiava responder, inúmeros dilemas a considerar, mas nem sempre a disposição necessária para realizar a pesquisa por conta própria. Naquela época, meu interesse — assim como o de vários dos meus colegas de classe — era ouvir o que nossos professores tinham a dizer e descobrir com quem mais nos alinhávamos em termos de opinião.

Em uma das aulas sobre o Antigo Testamento (AT), fomos apresentados aos diferentes tipos de sacrifícios realizados no Templo, incluindo as ofertas de libação. Para a surpresa de muitos, o professor explicou que as libações consistiam em ofertas de bebidas derramadas sobre o altar ou outros objetos cerimoniais. No AT, o vinho era uma das bebidas mais comumente usadas nessas ofertas (Êx 29:38-41; Lv 23:13; Nm 15:5). Enquanto ele explicava, era visível a confusão estampada nos rostos dos alunos. Afinal, até onde sabíamos, nossos professores compartilhavam da visão da nossa escola: a de que o consumo de bebidas fermentadas era um pecado. Como, então, os hebreus poderiam realizar ofertas de libação utilizando vinho, algo que parecia tão antagônico à piedade?

Meu impulso era levantar a mão e perguntar. Precisava entender como o vinho poderia ter sido incluído nas rotinas do Templo. Contudo, o silêncio constrangedor que pairava na sala não parecia um terreno fértil para questionamentos.

Foi então que um aluno corajoso ergueu a mão e interrompeu o professor com uma pergunta inesperada:
— Professor, então quer dizer que os hebreus bebiam vinho?

O ambiente ficou tenso. Todos os alunos se entreolharam, surpresos com a ousadia da pergunta. Por dentro, eu torcia para que o professor respondesse. Naquele momento da minha vida, essa era uma dúvida para a qual eu não tinha uma resposta satisfatória.

Para nossa surpresa, o professor não se irritou. Pelo contrário, ele sorriu gentilmente, ajustou os óculos e respondeu com serenidade, consciente de que estava lidando com um tema delicado.
— Sim — começou ele. — É verdade que os hebreus consumiam vinho em certas ocasiões.

Fiquei boquiaberto. Tinha certeza de que ele negaria essa ideia. Mas, como logo ficou claro, aquela não seria toda a sua resposta.
— No entanto — prosseguiu —, é importante lembrar que nem tudo o que os santos do Antigo Testamento fizeram deve ser tomado como exemplo a ser seguido. O AT menciona diversas situações em que o consumo de vinho resultou em consequências desastrosas.

O professor então começou a listar alguns desses exemplos. Ele falou sobre Noé, o homem justo que sobreviveu ao dilúvio, mas que ficou embriagado após beber vinho (Gn 9:21). Mencionou Nabal (1Sm 25:36), Urias (2Sm 11:13), Elá (1Rs 16:9-10) e Ben-Hadade (1Rs 20:16), personagens cujas histórias revelam como os excessos no consumo de vinho trouxeram consequências graves. Depois de expor esses casos, concluiu:
— Esses exemplos mostram que, embora os hebreus consumissem vinho, isso não era o ideal. A embriaguez era claramente condenada e vista como imprópria. Esses relatos servem para nos ensinar que o caminho mais seguro é evitar as bebidas alcoólicas.

Embora respeitasse meu professor, confesso que saí daquela aula insatisfeito. De fato, os exemplos de embriaguez no AT são alertas relevantes para os cristãos de hoje. No entanto, será que todas as ocasiões de consumo de vinho no AT terminavam necessariamente em embriaguez? Não haveria relatos de pessoas que consumiram vinho sem cometer excessos? E quanto ao uso litúrgico no Templo — seria aquilo um deslize dos hebreus? Por que Deus pediria ofertas de libação com vinho, se o vinho fosse intrinsecamente pecaminoso?

Voltei ao meu quarto com essas e outras perguntas. Conversei muito sobre o assunto com meus colegas nos dias que se seguiram. Infelizmente, não retornei ao professor para discutir minhas dúvidas. Contudo, sempre que podia, voltava à biblioteca em busca de livros que me ajudassem a entender melhor o tema. Alias, fiz isso por um bom tempo, especialmente durante o meu mestrado: No Seminário de Dallas, a Turpin Library oferece três andares de livros para a pesquisa teológica.

O que apresento nos próximos posts reflete parte desse longo processo de pesquisa, leituras e reflexões. Meu objetivo é demonstrar que há inúmeras evidências no Antigo Testamento que apontam para o fato de que o vinho fazia parte da vida cotidiana e religiosa de Israel. O vinho não era apenas um elemento simbólico de caráter teológico; ele estava presente à mesa e na liturgia. Aliás, sua presença como símbolo na futura intervenção de YHWH no mundo é um tema recorrente no AT, servindo como preparação para muitas das imagens que encontramos na vida e no ministério de nosso Senhor nos Evangelhos.

No post de hoje veremos as referências ao vinho como dádiva divina no AT. No próximo falaremos sobre o lugar do vinho da religião de Israel, e por fim, no terceiro post vamos considerar o vinho na mesa dos santos. A partir da imagem derivada desses três aspectos da vida comum de Israel, vamos demonstrar que os santos do passado bebiam vinho fermentado, o usavam em suas celebrações e na adoração a YHWH.

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